janeiro 18, 2011

À Quintana





dia desses, em que chove saudade
a menina que fui, encontrou-se com a mulher que sou,
no lado de cá do espelho
as duas se olharam e não se reconheceram, tamanho era o abismo entre elas,
e tão parecido com um labirinto era a imagem que se dava quando tentavam chegar mais perto.


como era um dia desses em que chove saudade,
me encostei na parede da memória,
e sorri com o tanto que ainda não sei de mim.


albanegromonte

janeiro 07, 2011

Desasossego de Hoje

"Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. 
O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto (...) 
Ah, mas como eu desejaria lançar ao menos numa alma alguma coisa de veneno, de desassossego e de inquietação. Isso consolar-me-ia um pouco da nulidade de ação em que vivo. 
Perverter seria o fim da minha vida. 
Mas vibra alguma alma com as minhas palavras? 
Ouve-as alguém que não só eu?" 

(Livro do Desassossego - Bernardo Soares - Fernando Pessoa) 

janeiro 06, 2011

Pedra na Lua





isto não é poema nem coisa alguma. apenas uma alma
cansada, decidindo falar mais do que
a boca pode.
ou deve.

este poema não é para você.
por favor, afaste os olhos, vá olhar lá fora que tem uma lua muito bonita no céu.
este poema é para quem merecer minha intensidade de sentir&querer
para quem não tem medo do amor
para que não se assombra com turbilhões&tempestades no meio da noite,
este poema é para quem gosta de andar na chuva, de cruzar distâncias com as palmas das mãos estendidas
para beijos e o que mais vier.
definitivamente, este não é pra você,
que fica que nem a lua, pousado no céu da minha boca
ao alcance da minha voz
mas fingindo que não me ouve.
e escrever pra você é que nem atirar pedra na lua.
você e ela não se mexem
pois pedra&poesia não os atinge.
-é coisa de louco mesmo- 
este poema é para alguém
que possa enlouquecer junto comigo
no meio de uma praça de uma cidade qualquer, de madrugada
quando só os tolos apaixonados, os guarda-noturnos e as mulheres em trabalho de parto
estão acordados
este poema é para quem gosta de subir escadas pra não elevar a dor
para quem come pipoca com vinho tinto barato, assistindo filmes B na TV
para quem ri de qualquer coisa,
que conhece o inferno, mas prefere o céu
para quem escreve o livro da vida na própria memória
para quem sonha de olhos abertos e se reconforta embaixo de cobertores desbotados.
este poema não é seu.
este poema é pedra na lua do seu inerte e pobre coração
que não soube reconhecer meu bem-querer por trás
das mal escritas e maltratadas linhas
de pretensa poesia
que escrevi uns dias tantos nestes anos
pensando em você.
talvez, eu tenha que pegar carona no próximo foguete
se quiser alcançá-lo.
mas, tinhosa do jeito que sou
é capaz de nem esperar foguete nenhum
e me agarrar na cauda do próximo cometa, pousar em você e olhando bem nos seus olhos castanhos
dizer, que este poema não é seu,
mas o próximo, será certamente.

albanegromonte

janeiro 05, 2011

Cores de Adeus




"o poeta é um fingidor... finge tão completamente,
que chega a fingir que é dor,
a dor que deveras sente"
Fernando  Pessoa


E o que de resto ficou,
meu amigo,
foi este ar de coisa sua cada vez que olho pro lado,
ou para dentro de mim.
Seu lugar na mesa,
na sala,
na cama,
na minha alma, por ora vazia...
Ficou uma canção perdida na memória.
 o cheiro, a cor, a dor
deste adeus tão sereno.
A lágrima inacabada,
o verso desfeito,
a flor seca, murcha e desmaiada
dentro do livro que nunca mais vou abrir.
Ficou ainda uma página mal escrita
maldita em sua brancura.
O vestido que não usei,
a sua cópia da chave,
a senha do banco eletrônico,
o anel azul de brinquedo
inteiro e abandonado entre as cores várias da minha
gaveta ninho de pássaros...
que dividi com seus objetos gatos famintos.
Ficou um pijama esquecido,
o vinil raro do Genesis,
a bandeira do seu time quase campeão.
(eu pensava ser campeã).
É assim que olho pro lado,
e pinto aquele seu olhar em aquarela de luzes
que vejo pelas persianas dos meus olhos,
cortinas agora rotas,
telas que são do que pensei
ser eterno e completo
com você.

albanegromonte