abril 23, 2007

To My Love


Nós dois, sutilezas inversas...


(para você, que sempre se soube ser minha paixão. mais que tudo.)


ele é ponto de exclamação, eu pergunto o tempo todo.

ele abre janelas quando amanhece, eu gosto de escuro.

ele nunca aprendeu a fumar, eu compro cigarros em caixas.

ele bicho-preguiça, eu enguia elétrica.

ele vive numa cidade invernada, na minha faz sol o tempo todo.

ele é bem resolvido, eu faço terapia.

ele fala com cachorros, eu adoro gatos.

ele é silêncio que tudo diz, eu falo pelos cotovelos.

ele coleciona jornais, eu gosto de revista em quadrinhos.

ele tem paciência, eu queria tudo pra ontem.

eu faço juras, ele promete.

eu atravesso o céu para encontrá-lo, ele me espera sentado.

eu tenho medo de baratas, ele assassina sapos com fogo.

eu procuro suas mãos ele me beija os pés.

eu choro com tudo, ele ri de qualquer coisa.

eu sou signo da água ele é da terra.

eu chego sempre atrasada, ele nunca perde a hora.

eu sou feita de emoções, ele é a pura razão.

eu tenho medo de morrer, ele sabe que vai viver pra sempre.

eu sinto frio de dia, ele toma banho de madrugada.

ele sabe jogar xadrez, eu fico na amarelinha.

eu nasci depois, ele veio antes pra reconhecer a trilha.

eu uso três relógios, ele nunca pergunta a hora.

eu joguei fora meu passado, ele guarda fotografias.

ele é um blues, eu sou tango.

eu sou espevitada, ele tímido.

eu tenho ciúmes do que seus olhos vêem, ele não se importa se eu andar nua.

eu sou a quinta avenida ele, a champs elisee.

eu ouço música no carro, ele dirige olhando a estrada.

eu tenho medo de velocidade, ele já foi piloto de corrida.

ele nunca me escreveu um poema, eu já lhe mandei uma carta de amor pelo correio.

eu rezo pra São Jorge que a gente nunca se separe, ele tem fé em São Lucas
eu acordo tarde, ele dorme cedo.

eu sou um soneto, ele um haicai.

eu gosto de cor-de-rosa, ele de amarelo.

eu digo que ele é meu namorado, ele disse que a sua casa é minha.

eu tenho um vidro de perfume na bolsa, ele cheira a sabonete.

eu ando olhando pro chão, ele mandou a Lua para mim.

eu sou louca pela voz dele, ele me pede pra cantar uma canção.

eu peço beijos o tempo todo, ele me beija além do tempo.

eu digo que ele sabe tudo ele me ensina a ser feliz.

eu quero estar sempre junto, ele me chama pra morar com ele.

eu digo que estou apaixonada, ele que nunca me esqueceu.
eu sou um bicho tonto, ele se embriagou no meu olhar.

e nós dois nessa roda de diferentes semelhanças, capturamos o tempo perdido e vamos por aí, felizes por tanto


albanegromonte

Eu, Por Mim


nasci pelo avesso.
segurei nos cornos uterinos da minha mãe, e não tinha quem me arrancasse dali.
só a ferros. como de fato aconteceu.
depois veio meu nome.
o avesso de mim. parece brincadeira: a brancura que ele inspira, contra a cor da minha pele.
um dia, brincando embaixo da mesa, ouvi meu pai dizer que queria mesmo que eu fosse menino.
explicados então, meus brinquedos esquisitos: carrinhos, revolveres, estilingues, pião, bola-de-gude...
era o avesso do sexo.
então fui pra escola e cada vez mais avessa, conversava com amigos invisíveis
vivia perdida nos livros
e nada sabia da tabuada.
avessamente cresci, e aprendi a gostar de bonecas.
aí meu irmão nasceu, e virei mãe aos sete anos.
nas horas de folga, cantava com o cabo da vassoura fazendo as vezes de microfone
e tendo como platéia, Sansão (o papagaio) e o gato da vez (foram tantos, e morriam tragicamente, sendo logo substituídos para que meu choro não acordasse a vizinhança e o bebê)
cresci mais um pouco, vivi meu primeiro amor com o filho da professora de Francês
e aprendi que homem não presta desde pequenininho.
fiquei avessa ao amor, e meti a cara nos livros (até de Matemática)
virei estrela do colégio
meus pais me mandaram pra estudar na Capital com tranças nos cabelos e cheirando a talco.
levava uma boneca escondida na mala, as fotografias dos gatos, a lembrança de um olhar que eu teimava verde e O Grande Gatsby para ler na estrada.

era o avesso das revistas da moda.
e ainda gostava de Chico Buarque&cia, ouvia Beatles e Genesis
quando o in, era Michael Jackson
aos 13 anos, avessei a adolescência
e tive que ser mulher sem nem ter menstruado.
aprendi a endurecer, sem perder a ternura, quando soube que existia Guevara.
chorava escondida no banheiro e escrevia longas cartas pra ninguém.
e a solidão me parecia tão natural...
entrei na faculdade aos 16.
tive que avessar os longos cabelos com franja, os vestidos floridos, os ursinhos de pelúcia
e aprendi a fumar, a beber e a passar noites em claro filosofando em alemão.
neste tempo, fui desaprendendo a desamar.
e me apaixonei tantas vezes
(ilusões avessas de quem não tinha crescido por dentro)
era virgem quando minhas amigas faziam abortos.
e avessei tanto a verdade, que acabei trepando sem lembrar que era a primeira vez.
não foi nada romântico.
e fui sofrendo os avessos da vida
até me dizerem que era uma cidadã.
passei a me sustentar, pagar impostos e saber o valor de um dia de trabalho duro.
e assim o avesso de mim desde o começo
começo a entender agora a dicotomia que em mim existe.
quando sou doce, lambuzo tudo a meu redor
quando quero bem, arranjo oito braços de prender,
quando penso que perdi, choro e ninguém liga
quando me sinto forte, todos se encantam
quando piso fundo, o poder exala do meu sorrir
quando estou triste, tudo ao meu redor fica escuro
mas se dou uma gargalhada, os girassóis giram ao sabor do vento e faz-se a luz
quando me amo, mesmo sendo avesso dos desejos que penso ter
o homem que está a meu lado se joga a meus pés
e quando me atiro nos seus braços
ele reluta e se afasta
então meu avesso é que é direito.
o que vejo no espelho não é reflexo
é a realidade.
eu sou avessamente deliciosa
quando me permito ser o que vejo através das minhas próprias retinas
e hoje, já usando truques de beleza para indefinir a idade real
sei que serei sempre a mesma menina que avessa de tudo
segurou firme nos cornos uterinos da mãe
e de lá só saiu a ferros!
uma guerreira. valente e vitoriosa mulher
que não tem vergonha de aprender como se goza.

albanegromonte

Salve Jorge!


Jorge sentou praça na Cavalaria,

Eu estou feliz porque eu também

Sou da sua companhia.

Eu estou vestido com as roupas

E as armas de Jorge.

Para que meus inimigos tenham pés

E não me alcancem.

Para que meus inimigos tenham mãos

E não me toquem.

Para que meus inimigos tenham olhos

E não me vejam.

E nem mesmo pensamentos eles possam ter

Para me fazerem mal.

Armas de fogo,

Meu corpo não alcançarão.

Facas e espadas se quebrem,

Sem o meu corpo tocar.

Cordas e correntes arrebentem,

Sem o meu corpo amarrar.

Pois eu estou vestido com as roupas

E as armas de Jorge.

Jorge é da Capadócia.

Salve Jorge!


Benjor

Da França


Aquele que olha, da rua, através de uma janela aberta, jamais vê tantas coisas como quem olha para uma janela fechada. Nada existe mais profundo, mais misterioso, mais fecundo, mais tenebroso, mais deslumbrante, que uma janela iluminada por uma lamparina. O que se pode ver ao sol nunca é tão interessante como o que acontece por trás de uma vidraça. Naquele quartinho negro ou luminoso a vida palpita, a vida sonha, a vida sofre. Para além das ondas de telhados, diviso uma mulher já madura, enrugada, pobre, sempre debruçada sobre alguma coisa, e que nunca sai de casa. Pela sua fisionomia, pelas suas vestes, por um gesto seu, por um quase-nada, reconstituí a história dessa mulher, ou antes, a sua lenda, que às vezes conto a mim próprio, a chorar. Se fosse um pobre velho, eu lhe haveria reconstituído a história com a mesma facilidade. E vou-me deitar, orgulhoso de ter vivido e sofrido em outras criaturas. Haveis de perguntar-me agora: -- "Estás certo de que essa história seja a verdadeira?" Que importa o que venha a ser a realidade colocada fora de mim, se ela me ajudou a viver, a sentir que sou, e o que sou?


Charles Baudelaire, "As Janelas".

Love Storyeta


no dia em que ela nasceu, ele comprou um livro de poesia. quando ela ganhou um velocípede, ele saiu on the road. ele tirando a carta de motorista, ela aprendendo a ler. ele casando, ela assombrada com os seios que nasciam. ela sonhando em morar na capital, ele estudando em Paris.

(aí aconteceu um monte de coisas... ele casou mais vezes, ela quebrou a cara com namorados incongruentes, fez duas faculdades, ele virou professor, guerras no mundo, a AIDS reinou pelo medo, descobriram que há vida fora da Terra, a cura pro câncer, os EUA deixaram de ser o xerife do mundo, os cara-pintadas ganharam a batalha, um presidente foi embora, ela começou a fumar, ele descobriu que detesta fumaça, uma princesa foi assassinada, uma santa morreu...)

ele olhando uma foto perdida por ela na rua, ela lendo um texto dele na internet. e um dia ele a escreveu, e ela tonta, respondeu. levaram mais de mil Luas pra decidirem se encontrar... a cidade, o número da casa, do vôo, o roteiro na mão. mas, tontos, os dois se perderam no caminho os fusos horários mudaram e viraram as placas da rua na madrugada do dia que seria o dia e choveu, o avião atrasou, o carro enguiçou, uma banca de revistas pegou fogo, ele ajudou a velhinha a atravessar a rua, ela ligou pra polícia comunicando um assalto, um guarda pediu documentos, ela resolveu comprar chocolates, e se perderam de novo na cidade, na rua, no número do vôo, do telefone, o roteiro saltou das mãos pro vento que passava. ele voltou pra casa, ela tomou o trem que passava na rua dele. ele chegou na janela na hora em que ela olhou pro céu procurando a Lua que ele lhe dera um dia. ele entrou, ela chegou no destino que já não era mais destino: era sina. e seus computadores se infectaram ao mesmo tempo e não tinham amigos em comum. a chuva molhou a página da agenda dele onde o número dela estava anotado em grafite, ela esqueceu a dela no banco do taxi. e hoje eles se buscam vias letteras&lácteas atrás deles mesmos e nunca se encontram, pois mudaram os fusos, trocaram as placas, acrescentaram números aos seus telefones e letras nos seus e-mails. mas todas as noites ela se lança numa estrela em busca da Lua onde ele pode estar, e ele no lado de lá da mesma Lua, olha para o mar em frente a casa dela tentando encontrar o sorriso que viu na foto perdida que achou um dia quando resolveu escrever-lhe e ela, tonta, respondeu...

mas isso já faz muito tempo.

e já é outra história em que nada disso acontece e os dois estão juntos e felizes até hoje.

albanegromonte 2oo5, dezembro, 28... ou não.

Das Cores


não sei porque permito, que esta dor me arranque o silêncio avesso da gargalhada, que é a lágrima que corre sem aviso pela face tocada por teus dedos na hora de partir.

nem sei porque insisto em bater nesta tecla enjoada, de te querer tanto e não ter nada de volta. não sei porque abandonar um navio com o tombadilho em chamas pra me jogar ao mar.

faz diferença a forma de morrer? (se morrer de amor for virtude).

e não sei mais, nesta madrugada demorada, se quero a virtude do amor com seus tropeços e coisas inexatas que só me tiram a calma e a paciência.

além do que não durmo, quando estou amando. pois só consigo fazer uma coisa a cada tempo.

e este é o tempo de te amar.

mas não sei se quero pra mim, este teu desapego, este teu silêncio, este gelo que não derrete ao calor dos meus beijos, das minhas palavras escritas&faladas a cada minuto do dia que passa sem que eu perceba nem em que mês estamos, se já passou o outro ou se é aquele em que ia te encontrar num bar, cheio de gente esquisita mas eu te saberia pelo cheiro, pela cor do sorriso, pelo olhar desviado de magenta plus green.

e eu nem entendo de cores. mas por você até decoro aquarelas... quer ver?

ardosia, cobalto, musgo, anis, lilás, preto&branco com traços de outras tantas cores...

e onde eu estava com a cabeça quando pulei do tombadilho se nem nadar eu sabia?

nesta madrugada cheia de nada&tudo que me desconforta encontro teu olhar no espelho invertido da parede do meu quarto. e olho pra tua fotografia roubada dentro de um livro e te beijo em pensamento enquanto dormes.

não sei porque teimo nesta angústia de querer te conquistar a qualquer preço me virando do avesso

fazendo do coração um ninho de corvos esfomeados e das tripas uma fome insaciável de te ter bem perto dos meus olhos, por hora cegos e tontos com tua luz.

mas vou me safar desta loucura toda quando amanhecer, e o telefone tocar com tua mansa voz a me dizer qualquer coisa

menos o que quero ouvir.

mas aí nada vai importar pois te darei a mão e não mais me afogarei nesta dúvida pois então saberei pelo calor que me correrá corpo&alma,

que sim tudo vale a pena, pois dizia o Poeta,

se a alma não é pequena.

e na minha que é grande, tem lugar pra teu qualquer querer.


albanegromonte

ano do Galo, décimo segundo mês

abril 03, 2007

Only You


Em que nuvem escondes teu sorriso?

Em que raio de sol, perde-se teu brilho?

Em que parte do Universo tanto te escondes?

Onde te perdi?


Lembrança de ti hoje me vem, doce como um favo de mel,

Suave como pluma de ave rara,

Lentamente, feito navalha que se crava na carne dolorida,

Lembrança do que não fomos, enterra-se em mim.


Em que grão do Universo te encontras agora?

Teu olhar, onde pousa?


Eu te espero desde sempre e nunca te pude ter.

Mãos minhas te buscam nas noites sem aviso,

E é para ti, esta lágrima feroz que corre em meu rosto, agora cansado.


O Tempo, rei e mestre da razão.

Faz-se sentir em minha pele, em meu corpo, em meus pensares e dizeres.

O Tempo, amor meu

Hoje te afasta de mim.


E o que serei sem esta tua presença tantas vezes sonhada, tantas vezes desejada?


Nada, ninguém pode
(ou quer)

Saber da dor maior que há em mim

Que é não te acolher em meu abraço,

Em meu regaço...
Dar de mim o que há.


Flor do meu desejo se finda nas horas que se passam

E busco em cada sorriso

Em cada olhar
(De quem nem mesmo se pensa)

Em toda e qualquer palavra que me diz

-Aqui existe amor.


Filho meu.

Em que recanto deste mundo sem porteira eu te perdi?

Será um dia em outra dimensão nosso encontro?


Retalhos do amor que guardei pra ti

Dissolvem-se em lágrimas tantas e todas

E sei apenas

Que sinto tua falta.


Por tua presença em mim

Eu cruzaria céus e mares

Desceria ao Inferno

Atravessaria o deserto e qualquer temor das gentes.


Mas não sei como.

Nem mesmo o porquê.
Deste desencontro de nós dois.

Sei que sinto tua ausência em tudo que faço,

Que te amo além.

E que um dia,

A gente se encontra.



albanegromonte