fevereiro 05, 2008

Lenda

e era então que eu dizia: por ali, não, Pedro.
mas ele, tinhoso que era, dava muxoxo, sorria aquele riso tão cheio de dentes e na boca bonita de se ver, mostrava a língua e me dizia: vou sim, Mãe. nada que tem lá que eu já não saiba de cor e mais. volto no fim do dia, antes que o sol, se deite. me deixa uma tapioca pronta e café.
e se ia, meu Pedro tão formoso, pros fundos da mata atrás de bicho com garras que valia dinheiro naqueles tempos que nem Nosso Senhor descendo do céu (que Deus me perdoe) assentava a cabeça deste meu menino e fazia ele deixar de querer achar um tal de Guará azul.
dizia ele, que este tal de Guará, tinha uma garra que mais parecia ser feita de pérola, pois era branca de doer na vista de quem já tinha visto. só que ele nem sabia quem era que tinha acontecido esta visão, pois se contava essa história desde menino pra ele mesmo, sozinho quando ficava no terreiro brincando com cavalo feito de maxixe que é uma verdurinha da nossa terra, que as criança pegam cru, botam uns palitinho de fósforo no lugar das perna e brincam até não querer mais. mas eu falava era do tal Guará azul, que só meu Pedro conhecia a história. e eu perguntava por que era de nome azul, se as pata eram branca? ele ria de mim, e dizia que era por causa dos olho do bicho. azulzinho da cor do mar que nós nunca tinha visto nessa vida, mas que Pedro me garantia que era sim, pois já sonhava duas vez que era um gavião e sentava os braços num açude grande até a vista não alcançar e era muito mesmo azul por ali, com uns pontos brancos que ele dizia ser as onda.
pois aí, Pedro voltava sempre no fim do dia, antes que o sol se deitasse. mãos vazias, sorrindo sem jeito, mas com a certeza de que amanhã achava o Guará azul, arrancava as garras dele (que matar bicho do mato, meu filho não fazia isso não, pois sabia que bicho era criação de nosso Senhor Jesus Cristo, amém) e vendia pros homem da cidade e nós ficando então rico, pagava as conta que o desinfeliz do pai deixou pra nóis pagar quando foi simbora daqui com a artista do circo que saracoteava junto do palhaço e do mágico. dizem por aí que hoje ele é o palhaço de lá, mas eu nem quero saber, que daquilo lá só teve que preste me dar esse filho tão lindo e tão bom, que eu as veiz até me assombro por ser meu.
e Pedro crescia e ficava homem, sem esquecer do Guará, indo cada vez mais e passando cada vez mais tempo enfurnado na mata.
teve que um dia, meu filho não voltou.
o sol se deitou e se alevantou, mas Pedro não me apareceu.
fui pra dentro da mata que me metia medo, mas queria mesmo era saber do meu filho, encontrar meu menino.
eis que se deu o causo que conto, e que Nossa Senhora me arranque os olho e a língua se for mentira.
de dentro de uma moita, enquanto eu gritava Pedro, meu filho, adonde que tu tá, menino... apareceu um bicho bonito que nunca vi, mistura de onça com gato, orelha comprida, focinho peludo, patas brancas e aqueles tais olhos azul que meu filho falava.
o bicho saltou perto dos meus pés e eu me tremi que nem tivesse caído no meio do rio, de tão frio que fez.
o bicho me arrodeou, cheirou e levantando a cabeça me sorriu um sorriso assim cheio de dentes e com uns olhos azul de doer dentro do coração, e saiu correndo elegante pela mata.
nem poeira ficou de rastro.
aí eu ainda parada que nem um cabo de vassoura, só que tremendo de medo, vi o que nesses anos todos eu negava.
os olho azul do bicho era o mesmo do meu filho.
e quando consegui dar um passo, pisei numa coisa branca que mais parecia uma jóia: uma garra do bicho Guará.
sorri chorando, sabendo que era o presente de despedida que meu menino me deixava, e que seu tempo de gente já tinha passado.
ele se encontrou e se foi.
meu filho Pedro Guará-Azul.



albanegromonte

Nenhum comentário: