Ele, um homem. Ela, uma mulher. Entre eles, o amor. Unha e carne, corda e caçamba. À noite em seu ninho, eles se faziam disso, diluindo-se um no outro, desafiando a química- eram água e óleo. Ele, o óleo; pegajoso, forte, impregnando a pele dela, deslizando-lhe pelos seios e coxas, enluvando-lhe as mãos tão nuas. Ela, a água; transparente, frágil, lavando a alma dele, descendo em correnteza pelo seu peito e braços. Acreditavam em reencarnação e se encarnavam um no outro, em vida, por não terem tempo de esperar pela morte. As unhas dela, longas, vermelhas, penetravam-lhe as costas e chegavam até seus pulmões , respirando por ele. E ele ria de não poder respirar; e ela fincava-lhe as garras, permanecendo junto para ele não morrer. Em troca, ele beijava-lhe o ouvido, percorrendo com a língua molhada, seus misteriosos ossículos e labirintos, chegando ao cérebro, pensando por ela .E ela ria boba, com a saliva escorrendo-lhe os lábios de louca, por não precisar ter lógica. E as cordas tendíneas dos seus corações tocavam juntas uma sonata desconhecida. E eles dançavam , continuando a se encarnar. Os dentes dela, cravados na sua jugular derramavam sangue brilhante, mas ela lhe detinha o fluxo com pálpebras macias. O nariz dele, cheirando seus braços, tomando-os de assalto, paralisando-os num abraço gigante. Suas pernas entrelaçadas impediam o trote e eles rastejavam pela cama em busca do espelho. E se olhavam, e se viam e sorriam um para o outro, em harmonia com a lua crescente e o vento Terral que invadiam as paredes do quarto. Ele e ela. Um homem, uma mulher e o Amor. Antes do amanhecer, eles já eram um. A massa sem forma, pulsante e bela na sua poesia, gemia e ria, rolava pelas paredes e chão, perfumando o ar, trazendo pássaros noturnos à janela aberta, que codificavam uma canção de amor em Si bemol. As suas mentes decifravam os segredos um do outro. Suas mãos eram quatro em tamanho e poder. Seus corações pulsavam em uníssono. Suas peles tinham o mesmo suor. Suas retinas confundiam imagens: visões dele, visões dela. Seus longos braços abraçavam suas pernas e seus sexos se mesclavam no primitivo ser arqueológico que não sabia se era Macho ou Fêmea até que se inventasse o pecado. Seus cabelos se enrolavam em seus pêlos, suas lembranças se misturavam num só quadro e as palavras, se é que havia, partiam de uma mesma boca, com um só tom de voz. E quando a estrela rainha, rasgava o manto da madrugada com seu calor, entregaram suas almas a Deus e seus corpos sussurraram Amém.
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