setembro 30, 2010

Lady Cronopio, Num Dia Distante...


Pedra de sal nas pernas molhadas de mar, rosa amarela flutuando nos cabelos negros e vestida de nada, ela segue as ondas derramadas na areia. Risca no ar um nome com sua varinha de condão (digo isso, porque ela parece uma fada), lança um desejo e aguarda a Madrinha resolver se entrega de vez a este homem voz, canção e poesia, por quem ela espera há séculos. Na areia, encontra um espelho e se vê com olhos de mulher feita. Já não é mais uma menina, mas traz nos sulcos indefinidos, as marcas de tudo que sentiu neste mundo em que vive há tanto... Cada lágrima, cada sorriso, cada esperança perdida e reencontrada, cada pedaço de vida e nenhum de morte, que desta ela se livrou. Lamenta que o elixir foi-lhe oferecido tão tarde... Lamenta que Ele não tenha tomado também. Sorri um sorriso meio de lado que lhe contorce os lábios vermelhos de desejo. Sabia que o encontraria um dia. Sabia que a vida não se acabaria num fio de navalha covarde, numa noite tão feia, quando Paris era feia, e cheirava a excrementos e sangue humano. Agora que o encontrara, voltava ao mar para exigir a promessa da Madrinha, que por lá e naquele tempo tinha outro nome... Até os deuses mudam. Entra no mar sem medo, mergulha a cabeça nas ondas frias e abre os olhos pra ver... Um cavalo-marinho se aproxima, abre a boca e a beija. Um beijo de água e sal. Um beijo molhado. Um beijo de tudo. Ele se agarra às suas coxas e dissolve saudade em fragmentos de gozo. Ela reconhece o beijo, o abraço, o toque certeiro e sereno de quem sempre soube como ela gosta. Sua cabeça fica tonta, seus braços e pernas se deixam levar pelo peso da sua vontade de se abandonar ali. O seu corpo, a carrega até a superfície. Ela acorda com a brisa da noite tocando seu rosto. Atenta ao silêncio, ouve um assovio dolente e longínquo... Levanta-se, olha pro mar que mais uma vez a devolveu e pensa que agora já sabe onde ele se escondeu todo esse tempo. Sorri para seu umbigo e decide viver.

albanegromonte

6 comentários:

Unknown disse...

Aleatoriamente ele abre o volume das obras completas. Atônito, querendo, precisando comentar:

"Mas enquanto lá embaixo ele era acolhido pela profundeza impenetrável, a cabeça ainda erguida sobre a nuca, lá em cima o seu nome disparava sobre a pedra com possantes ornatos.
Encantado com a visão, ele despertou."

E tudo se evaporou, texto, comentário, desejo e prazer.

Parabéns, menina. Beijos. (act)

Menina disse...

Han?Lady Cronópio saiu da caverna e com força total!
Excelente!
Lindo de viver e de se admirar!
Orgulhosíssima de você!

Lendo e relendo...

Amor,

Menina.

Anônimo disse...

Sentidos aflorados esses...

beijo.

Lady Cronopio disse...

Djabal, como você consegue?
Sempre aquela coisa toda para você.
Beijos

Lady Cronopio disse...

Evellyn, grata pela visita e comentário gostoso de ler.
Beijos

Lady Cronopio disse...

Menina, às vezes é preciso a releitura para se compreender o sentido verdadeiro.
Bom ter você por perto.
Xero