novembro 30, 2006

Estrelas De


Horas todas passam por mim
enquanto sentada, frente a frente com o relógio
percebo que são elas, soldados números
que escapolem do espelho onde
perco minha imagem e semelhança
com qualquer personagem que tenhas lido.
Eu e as Horas somos.
quem diria não, neste instante de ser contente?
brincar de colibri, de flores em plástico
de bombas chocolate e pára-raios nas cortinas
arremedadas no fogo de vela que nunca se acende.
Ah.
Mas e o que seria desta fumaça insana se não fossem teus ruídos
fundo do poço onde me enlevo
e bebo em cada palavra um algoz xarope amargo
(doença se cura com dor e com remédio ruim)
poço onde emposso tua imperatriz de gelo
ante meu caliente e enorme coração que nunca
nem hoje que, aprende a desbater...
Coração este que grita, sussurra e treme bambu que é
não quebra, não parte, não rasga
embrutece e logo mais se acende em colares de topázios colhidos numa rua
mineira ou baiana
quem saberá com certeza?
era brilho, isso eu vi.
e se aquele vitral lilás trouxer a luz do sol se pondo
será quase noite e eu te esperarei numa colina
vestida de branco
flor vermelha no cabelo e pés descalços
de tanto caminhar
e mesmo que chegue a madrugada sem ti
acenderei fogueiras de nossos sentires
e deixarei que anjos bebam deste vinho
neste cálice
seio meu
guardado pra ti.
Um dia.
Ou outra tarde
virás
e eu saberei de ti quem era desde o princípio
quando Tudo era o caos
e nem estrelas eram pó.

albanegromonte

novembro 29, 2006

InSidE


me vejo deserto.
aproxima-se uma Lua violeta,
um peixe sem cor.
me vejo deserto sem tua palavra.
ave, palavra!
sem teu olhar sobre meu umbigo crucificado,
meu corpo sonâmbulo molambo,
se desloca insano
pelas madrugadas frias e pelas ruas sujas.
minha alma está contigo.
e eu, deserto
parada em doses maciças de pílulas amargas
tento achar o caminho do mar,
da linha do trem, da janela aberta
da bala de prata.
eu, deserto.
minha alma contigo.
meu corpo sujeito à lei da gravidade.
Ícaro moderno
me jogo pelos espaços virtuais,
achando enfim o vazio
que me deixaste como endereço
na partida de nós.

albanegromonte

novembro 28, 2006

Da gaveta antiga...


Um dia, quem sabe, ela, que também gostava de bichos,
apareça numa alameda do zôo,
sorridente, tal como agora está no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela, que, por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo Século
ultrapassará o exame de mil nadas,
que dilaceravam o coração.
Então, de todo amor não terminado seremos pagos
em inumeráveis noites de estrelas.
Ressuscita-me, nem que seja só porque te esperava
como um poeta, repelindo o absurdo quotidiano!
Ressuscita-me, nem que seja só por isso!
Ressuscita-me!
Quero viver até o fim o que me cabe!
Para que o amor não seja mais escravo de casamentos,
concupiscência,
salários.
Para que, maldizendo os leitos,
saltando dos coxins,
o amor se vá pelo universo inteiro.
Para que o dia, que o sofrimento degrada,
não vos seja chorado, mendigado.
E que, ao primeiro apelo:
- Camaradas!
Atenta se volte a terra inteira.
Para viver livre dos nichos das casas.
Para que doravante a família seja
o pai, pelo menos o Universo;
a mãe, pelo menos a Terra.

Maiakovski

novembro 04, 2006

Elric


trago em cada dedo enfileirado
uma pétala de nossos dias
atravessados pelas soleiras
de uma solidão vadia
que a ti, diverte
e a mim inquieta.

em cada traço da mão que lava a outra
um caminho de te procurar
mas como, se nem sei a cor que tem teus olhos
ou a marca do teu sorriso.

cada traço do desenho de giz
no quadro negro do teu mistério
tem a acidez e a secura do grão de areia
que se perdeu do mar.

cavalos -marinhos se distraem em mim
parindo os filhos que não fiz
e centauros desfalecem de amor
enquanto as múmias de meninos faraós
rodopiam no corredor da minha casa- hoje nem tão minha

luz de vela me queima a alma
e lágrimas sobem do peito aos olhos
se derramando em poeira
que diria, se soubesse,
são das estrelas que te dei.

invento passos de dança
te convido, te mando pérolas negras
e estilhaços de poemas ainda não nascidos
te abraço em nada
(abraço)
e sonho contigo quando consigo dormir.

mas então, já dia
e espero a noite
pra te sentir na distãncia
dos cabos desumanos e insanos
que te alavancam daí
e trazem aqui
bem perto
pra mim.

albanegromonte

novembro 02, 2006

Urbana Legião


pois se não é em ti
haverá de.
outra luz, outro sol, outro amor.
nuvem de açúcar acende em bemóis atrapalhados
sinos tocam e o céu abre uma janela pro meu sorriso.
se não em ti será.
outra boca, outro beijo, outro peito
eu, mulher de pescador, ao vento
beira do mar poente
esperando a volta
o cheiro de sal
o gosto de mar
a mão calejada das pelejas com sereias e Poseidon
a me invadir os cabelos negros então.
por não ser mais tu
eu serei.
um dia feliz
assim quase sem querer
só pra ser.

albanegromonte